Lesões na Corrida





  
A prática sistemática da corrida, especialmente da corrida de rua, como forma de melhoria da saúde e prevenção de doenças passou por um crescimento espantoso nos últimos anos. Paralelamente aos inúmeros benefícios à saúde, devido às características inerentes de sua mecânica e das exigências de seus treinamentos, a prática da corrida pode trazer consequências ao sistema músculo-esquelético de seus praticantes na forma de lesões e dores.


Evidentemente, tais consequências não ocorrem simplesmente por praticá-la. A popularidade dessa modalidade levou muitas pessoas à prática sem orientação profissional e, com isso, ao desrespeito pelos princípios de um treinamento seguro e à realização de excessiva sobrecarga, seja no volume ou intensidade de treino excessivo, seja pelo desrespeito à progressão individual deste volume ou intensidade.

Porém, mesmo aqueles que procuram orientação profissional (diga-se de passagem, orientação de um profissional de Educação Física especializado em treinamento de corrida), podem ainda assim apresentar dores e lesões oriundos da prática.
  
Abaixo apresentamos os principais fatores que predispõem alguém a uma lesão na prática da corrida. Vale lembrar que a origem de qualquer lesão é multifatorial e pode ter em sua origem um ou mais desses fatores.

 Os principais fatores que predispõem alguém a se lesar na prática da corrida são:
  
Erros de Progressão do Treinamento: o principal erro cometido por quem não tem orientação profissional é o de aumentar a distância corrida de maneira inadequada ou em momentos inadequados. Por exemplo, uma pessoa com pouco treino já deseja correr 5 kms por dia, e quer fazer isso todos os dias o que acaba sendo excessivo. Isso coloca uma sobrecarga demasiada sobre o corpo dela que, via de regra, resulta em dor ou lesão. Ou então o atleta sem orientação deseja correr a meia maratona e resolve fazer o percurso da prova como treinamento 3 ou 4 dias antes da prova. Acaba se tornando incapaz de concluir a prova, ou a conclui com dores e/ou uma nova lesão. Não é assim que deve ser feito.

Falta de descanso: após um treinamento intenso, nosso corpo sofre microlesões em diversos tecidos. Essas microlesões são, na verdade, o começo de um processo de fortalecimento daquele tecido. Ou seja, o tecido se recupera do esforço e se torna mais forte. Se impedimos que esse processo aconteça por falta de descanso, o tecido não se recupera adequadamente, e expô-lo novamente ao treinamento vai enfraquecê-lo, predispondo-o a se lesar.

Erros do movimento esportivo: cada vez mais estão sendo publicadas evidências científicas de que movimentos inadequados ou excessivos (pisada pronada, rotação de joelho ou quadril, dentre outras) predispõem corredores a lesões. A prática da corrida leva a milhares de passos por treinamento ou competição, se existe um movimento inadequado que sobrecarrega excessivamente uma estrutura, essa estrutura será assim sobrecarregada a cada passo. Cabe uma ressalva de que não é porque você tem uma alteração de movimento que você necessariamente terá alguma lesão. A tendência é de que a alteração sobrecarregue em excesso uma ou mais estruturas, mas não podemos afirmar que essa sobrecarga vá causar lesão. Pode acontecer da evolução do treinamento ter sido tão adequada e progressiva que, apesar da alteração, o corpo conseguiu se adaptar e tolerará-la.

Falta de condicionamento físico: pessoas sem condicionamento físico adequado tentam começar a prática da corrida e se excedem, caindo nos Erros de Progressão do Treinamento, que mencionamos acima. É importante ter um condicionamento físico de base, com músculos fortes, para se ter mais segurança na corrida. Existem corredores que não gostam do treino de força, mas este lhes beneficiaria tanto em termos da performance, na correção/prevenção de erros de movimento e na prevenção de lesões.
   
As lesões mais comuns na prática da corrida são:
  
Condromalácia Patelar e a Síndrome Fêmoro-Patelar:
(Condromalácia Patelofemoral e Síndrome Patelofemoral)

São duas condições que têm a mesma origem, ou seja, as alterações da mecânica correta do joelho, e que muitas vezes coexistem, e por isso são confundidas como sendo a mesma entidade, o que não é verdade.

Condromalacia Patelar é uma condição de degeneração da cartilagem que recobre a patela, o pequeno osso que temos à frente do joelho e que sobe e desce pela articulação quando esticamos ou dobramos o joelho. A Condromalacia acontece pois a patela “bate” ou “raspa” contra a tróclea femoral e vai se desgastando.

Síndrome Fêmoro-Patelar é uma condição caracterizada por dores ao redor e atrás da patela, cuja origem nem sempre é claramente definida, mas que frequentemente está ligada à compressão do osso subcondral (que está atrás da cartilagem da patela), de pinçamentos e inflamações da membrana sinovial do joelho, e de sobrecarga de tecidos miofaciais ao redor da patela. E o que está por trás desses eventos é justamente a alteração da mecânica correta dos joelhos. A dor da Síndrome Fêmoro-patelar se manifesta principalmente nos momentos em que se dobra ou estica o joelho como ao correr, agachar ou subir ou descer escadas.

Mecânica da Lesão: Tanto a Condromalacia Patelar como a Síndrome Fêmoropatelar ocorrem devido aos repetidos movimentos de dobrar e esticar o joelho, especialmente na presença de certas alterações (como alterações de movimento, desequilíbrios musculares e outras) que vão fazer a patela se deslizar de maneira inadequada ou aumentar sua compressão contra a tróclea a cada passo, e assim favorecer o aumento da sobrecarga na cartilagem e nos tecidos ao redor da patela.
  
Fasciíte Plantar
(Fasceíte Plantar)

Fasciíte Plantar é um processo degenerativo da fáscia plantar, tecido que recobre a planta do pé e dá sustentação a este. A dor da fasciíte é na sola do pé, em geral logo à frente do calcanhar, e um dos momentos em que se manifesta com maior clareza é quando damos o primeiro passo após levantarmos pela manhã.

Mecânica da Lesão: a cada pisada o peso do corpo fica apoiado apenas em um pé, o que tenderia a colapsar o arco do pé. Para impedir que isso aconteça, a fáscia plantar é esticada, ficando tensa e ajudando a suportar o peso do corpo. Essa exigência constante, especialmente se associada a certas alterações de movimento (tais como a pisada pronada ou uma corrida muito verticalizada), provoca seu desgaste (as microlesões de que falamos). Se a corrida for em excesso e/ou não haver o descanso adequado, as fibras da fáscia podem começar um processo degenerativo que é a fasciíte.
  
Síndrome da Banda Iliotibial
(Síndrome do Trato Iliotibial)
  
A Síndrome da Banda Iliotibial é uma condição de dor e inflamação da Banda (ou Trato) Iliotibial. A Banda Iliotibial é um tecido fibroso presente na região lateral da coxa, que se origina de um músculo fixado na bacia (o Tensor da Fáscia Lata) e se fixa na perna, imediatamente abaixo da articulação do joelho.

Mecânica da Lesão: a inflamação é promovida quando esse tecido se atrita contra o côndilo lateral do fêmur, que pode ser descrito como uma pequena proeminência óssea na região lateral (externa) do fêmur (na parte de baixo da coxa), logo acima do joelho. Em condições normais esse atrito não existe ou é muito suave, mas na presença de erros de movimento ocasionados por diversas razões, dentre elas uma técnica incorreta ou a falta de atividade muscular adequada, esse atrito aumenta e, sendo repetidas vezes durante a corrida, acaba por irritar o tecido gerando a resposta de dor e inflamação.
  
Fraturas de Stress

As Fraturas de Stress são fraturas do osso que ocorrem ao longo do tempo, devido ao impacto repetitivo da corrida. Isso contrasta com a forma mais conhecida das fraturas, que envolve um evento mais repentino, como uma batida ou acidente no qual ocorre a “quebra” do osso. Os locais mais comuns em que os corredores sofrem fraturas de stress são no osso da perna (tíbia) e nos metatarsos.

Mecânica da Lesão: Nas fraturas de Stress o osso é exposto excessivas vezes ao estímulo ou não lhe é dado descanso adequado entre os treinos, e com isso ele não consegue se recuperar do esforço imposto. Isso vai ocasionando pequenas falhas nele que, à medida que o tempo passa, se transformam numa fratura. Isso pode ocorrer tanto devido ao impacto direto, como ao tracionamento de músculos puxando e desgastando o osso (geralmente uma conseqüência da Síndrome do Stress Tibial – ver abaixo – não tratada adequadamente).
  
Síndrome do Stress Tibial

A Síndrome do Stress Tibial muitas vezes é chamada também de “canelite”. Ela, na verdade, é uma periostite, que é a inflamação do tecido que fica na superfície do osso, o Periósteo.

Mecânica da Lesão: ela se origina de forças de tração (puxar) de músculos que se fixam no periósteo. Esses músculos puxam repetidas vezes, com muita força, e o periósteo não consegue se recuperar no espaço entre as sessões de treino, com isso acaba desenvolvendo uma inflamação. Os locais mais comuns para uma periostite são na frente do osso da perna (tíbia), sendo que nesse caso a periostite se deve à tração do músculo tibial anterior, e na região medial (interna) da perna, sendo que nesse caso o músculo responsável é o tibial posterior.
  
Tendinopatia de Aquiles e Tendinopatia de Quadríceps

As Tendinopatias são alterações degenerativas dos tendões que podem ou não se iniciar num evento inflamatório (tendinite). Elas se caracterizam por uma desorientação das fibras do tendão, que normalmente paralelas, assumem direções perpendiculares, se entrecruzando e perdendo sua capacidade de resistir adequadamente à tração mecânica. A dor das tendinopatias acontece quando fazemos força com a musculatura, o que causa o tracionamento do tendão e, consequentemente, dor. Os dois locais emque os corredores mais desenvolvem tendinopatias são no tendão de Aquiles (tendão da panturrilha, atrás da perna) e no tendão do Quadríceps (à frente do joelho).

Mecânica da Lesão: tanto o quadríceps como o tríceps da perna agem como controladores do movimento, na hora em que apoiamos o pé após o avanço da perna, o quadríceps controla o dobrar do joelho, enquanto a panturrilha controla o dobrar do tornozelo. Se esse controle não ocorresse, cairíamos no chão a cada passo da corrida. Essa ação de controle exige muito dos músculos e de seus tendões. Havendo excesso de treino, falta de descanso adequado, ou alterações de movimento a chance de se iniciar o processo degenerativo do tendão aumenta.
  
Estiramento Muscular na região posterior da coxa
É a ruptura das fibras dos músculos posteriores da coxa, chamados de músculos Ísquiotibias.

Mecânica da Lesão: Existem dois momentos onde os músculos posteriores da coxa podem ser lesionados. O primeiro é na transição da fase em que a perna está apoiada para a fase onde ela está se movendo para frente. Nesse momento, uma porção das fibras do músculo estava se encurtando e, repentinamente, passa a se esticar. Se essa transição não ocorre adequadamente, as fibras musculares correm risco de se romper. O outro momento é pouco antes do pé se apoiar no chão. Nesse momento a coxa está se movendo para frente e a perna se esticando. Isso faz as fibras dos músculos se alongarem ao mesmo tempo em que o músculo tenta se contrair para controlar o movimento de esticar da perna. Esse controle muscular, se não ocorre de maneira adequada, pode provocar a ruptura das fibras.
  
Neuroma de Morton

É a dor e inflamação decorrentes da compressão de pequenos nervos próximos aos dedos.

Mecânica da Lesão: os nervos interdigitais passam entre as cabeças dos ossos metatarsos (os ossos que antecedem os dedos dos pés, sendo a cabeça deles a região que se articula com os dedos). Devido ao impacto da pisada contra o chão, esses nervos acabam se lesionando e iniciando um processo inflamatório.
  
Sesamoidite

É a dor e inflamação dos tecidos juntos aos ossos Sesamoides, que são dois ossículos que temos abaixo da cabeça do 1º metatarso.

Mecânica da Lesão: Os ossos Sesamoides são comprimidos a cada passo na corrida. O impacto repetitivo pode vir a provocar dores e desenvolver a inflamação.




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